domingo, 7 de maio de 2017

Luíza Possi | Som de amor próprio


Tudo que é ruim passa, mas o que é bom é datado também. A diferença são as memórias que ficam. O que foi ruim vai sem deixar saudades, porém ficam marcas profundas na maioria das vezes. O que foi bom, do nosso agrado, fica salvo na lembrança como o indicio da felicidade. Fica no exalar do perfume, na letra da canção, numa camiseta amassada no fundo do guarda-roupa, ou simplesmente no instante silencioso que traz como um flash aquilo que se viveu. Mas não sejamos reféns do passado.

Escrevo esse texto antes de qualquer coisa para mim mesma. Esses dias me peguei remoendo memórias de uma relação de uns 3 anos atrás, e isso martiriza um bocado, porque a gente se pega idealizando com o nosso famigerado “e se..?”. E se um caralho, meus amigos. Sejamos gratos por cada coisa boa que nos ocorre, mas não os idealizemos, porque a probabilidade de “quebração” de cara é enorme. As impossibilidades das relações e das oportunidades que não rolaram tem seus porquês. Se você tentou o melhor que poderia naquele momento e as coisas simplesmente não aconteceram, então aquilo não era seu, aquele não era o seu momento. A gente não precisa ser religioso pra acreditar que tem coisa que não pode ir pra frente por simplesmente não ser a hora de acontecer ou não ter que acontecer.

E com relação as experiências ruins, não precisamos nos privar do sofrimento. Amoitar sofrimento é como tentar conter o curso de um rio. Eu sou a maior especialista em amoitar sentimento que você respeita. Minha mãe costuma dizer que eu me fecho em uma concha. É horrível viver assim, gera uma amargura e nos impede de enxergar as possibilidades nos acontecimentos. Fazer de conta que coisas ruins não aconteceram não pode ser uma alternativa. Se permita sentir, não tenha vergonha disso. Tenho tentado aprender a viver essa permissão.

Nunca vi chorar tanto por alguém
Que não te quis, deixe estar
Que ele vai voltar, louco pra te ver
Então verá, que você cresceu
E apareceu em seu lugar
E hoje está louca pra sair
Sem saber que horas vai voltar

Já escrevi sobre o 5 a Seco em outra postagem, eles estão aqui novamente através da letra de Deixa Estar, mas a voz que deu vida a essa canção na minha memória foi Luíza Possi. A música é de 2011, Luíza colocou sua pegada em cima da letra sempre realista dos caras do 5 a seco. O que eu particularmente gosto das letras deles é que não tem muita firula, sem invenção, é na lata. E Luíza é poder, né mores? Essa música encaixa perfeitamente nas propostas musicais que a gente já conhece dela.

Deixa estar é aquela sacudida de poeira que todo mundo precisa na vida. É um diálogo, daqueles que só uma pessoa que tá de fora da situação pode jogar umas verdades na nossa cara. É certo que muitas vezes a gente pega ranço dessas verdades, porque de fato elas estão ligadas a coisas que são obvias para gente também. É, muitas vezes a gente permanece na merda pelo medo de dar o passo a diante por mais que a relação já esteja desgastada, ou já seja algo fadado a dar errado. Todo mundo vê, sabe, comenta, te fala, aconselha, mas não tem jeito. Você, por orgulho ou pretensão, não toma uma decisão de findar essa marmita de ontem que se tornou esse relacionamento.

Eu quero mais é te ver na pista da vida
Dançando sem parar
Eu quero mais é sumir com as pistas
De onde ele foi parar

A vida tá ai pra ser vivida. Com as amarguras e com as delicias de cada instante, se apresenta como uma dádiva diária. E temos sempre que desejar e experimentar essa entrega. Na privação do ser, deixamos passar o que de fato importa: a eternidade de cada momento. Que nos joguemos mais nas experiências. Por esses dias, me bateu uma aflição quando percebi que eu não tenho uma bucket list. Deve ser meu sol em Touro e ascendente em Capricórnio. Mas na verdade, eu sempre pensei nos meus desejos como coisas que para muitos poderiam ser triviais. O conforto de um refúgio, o dinheirinho para descobrir novos lugares e me jogar em paradas gastronômicas e ter o cheirinho de um outro alguém no lado esquerdo da cama. Mas até esses sonhos, ditos simples, já são motivos para mover e levantar para enfrentar a jornada todos os dias. A gente se motiva com o que tem.
A gente gosta de complicar. Isso é tão intrínseco a nossa existência. Complicar é como um velho desafio contra nós mesmos, onde tentamos nós provar que estamos errados. Olha que parada louca. Temos tudo que precisamos, mas nos falta a humildade de entender e assumir que erramos. Não tem nada de vergonhoso em assumir que precisamos dar meia volta ás vezes. A gente tem que admitir que entramos em furadas, o vergonhoso é não se permitir sair delas. A gente tem muita pretensão em achar que podemos moldar as pessoas aos nossos gostos e que elas vão mudar sempre porque acreditamos ser o melhor para elas. Isso só prova o quanto achamos que somos mais do que realmente nossa mãe pariu.

Se ele não ligou, nunca te escreveu
Não vai prestar, chega aqui
E eu vou te falar o que você sempre quis ouvir
Deixa isso pra lá
Que isso não pode ficar assim
Põe um fim
Ele vai voltar louco pra te ver
E então verá


O que falta é amor próprio. Não podemos confundir o lado pretensioso que temos com amor próprio. Tá cheio de gente por aí que acha que é a dose de dipirona da vida de alguém, mas que na verdade não consegue lidar nem com a própria realidade. Rupaul já nos ensinou que “if you don't love yourself how in the hell you gonna love somebody else”. Mas é uma peleja diária, amor próprio e aceitação não brotam no canequinho com algodão e broto de feijão, mas é um exercício. Tem que começar em não remoer os fracassos. Se vier na cabeça, se bater na porta, se passar na rua ou ouvir na rádio, simplesmente deixe passar. Tudo passa.  

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