segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Pearl Jam| Notas mentais do cronograma de um dia qualquer


Eu acho que alguém precisa apertar o reset. Se o mundo foi planejamento de alguém, é interessante que perceba o quanto essa apresentação em PowerPoint deu errado e volte aqui pra desfazer esse equívoco de humanidade que se perdeu no meio do caminho. A sensação é de que a vida virou um barco à deriva onde não adianta ter sinalizadores para o resgate. Estamos todos cegos.

Tudo isso não é de agora. É mais do mesmo, é feijão de ontem. Nossa estagnação é maior que nossa revolta e ficamos aqui comendo em grandes colheradas dessa desumanidade fast food que o mundo se tornou. Nada anda fazendo sentido. Não se vale mais os argumentos científicos, os livros, as estatísticas. Viramos estatísticas. Somos mais um número em uma página de jornal, mais um nome lamentado em uma mesa de café. Somos mais um em meio a tudo que se destrói, que se perde em meio a falta de amor, a falta de respeito. Isso tudo tem parecido um videogame que alguém repetidamente tem dado start, mas continua levando um game over no meio da cara todos os dias.

É melancolia da minha parte. Ela se tornou crônica em meio a todas as cacetadas que levamos como sociedade diariamente. Fomos excluídos do debate político nacional. Os senhores dos tronos de Brasília estão cagando e andando para nossa opinião, da mesma forma que o fizeram para os nossos quase 55 milhões de votos. Semana passada (mas poderia ter sido hoje já que todos os dias é um soco na cara diferente), em meio as notícias acerca das privatizações e outras tantas manobras, eu só me senti anestesiada por alguns segundos e pensei que eu só queria desligar, viver em um mundo paralelo e não ter a menor ideia do que tá acontecendo. Sentir isso é deprimente, pois é um retrato em cores de que eles venceram em nosso subconsciente.

Me reanimo. Respiro. Bebo um copo d’água e respiro fundo. Deixo passar. Sigo.

Em meio a tudo isso, tô lá na Academia. A vida dentro dos muros da universidade é um paradoxo. Sabe, em um momento a gente até acredita que vai ficar naquela bolha desfrutando da presença de pessoas de esquerda, que dizem que foi golpe e gritam Fora Temer! Mas aí a gente acorda, pega a nuvem e desce. Alice no pais das maravilhas foi um sonho, lembrem disso. A Academia e essa ideia que o conhecimento liberta ficou na teoria. Na prática, você tem que tá lidando com três tipos de humanos, os que conhecidamente são o contrassenso (e desses não esperamos nada além de ódio e apoio a todo tipo de lixo aka Bolsonaro, Trump e todas as merdas afins), os camisas vermelhas por conveniência e os que ainda me fazem está por lá. Sobre esses que resolveram por conveniência se proclamarem como parte da luta, falar sobre desconstrução e bancar de entendidos dos problemas do bairro só tenho isso a dizer: vocês não enganam ninguém. Sabemos muito bem que fazem parte de um núcleo que só acredita em igualdade entre os pares, e que nós não contamos entre eles. São apenas mentes cheias de textos, corpos sem vivência e falta de empatia.

A parede da Universidade é fria. A mente fica abarrotada. Há um vazio de humanidade lá.
Aí eu tenho que chegar na escola na segunda-feira, entrar em uma sala de aula onde eu vou dar de cara com aquele aluno estuprado e que a família ainda jogou a violência na conta dele. FODA. O mundo é uma merda. Penso sobre do que estou servindo. Para que estou ali? Me pergunto o que a academia me acrescenta, o que minha pesquisa e todo falatório que transponho em páginas vai servir para essa criança. Meu lattes vai ajudar ele em algo?  Não tenho respostas.

Fecho os olhos. Choro. Respiro. Deixo passar.

Ontem fez 26 anos que o Pearl Jam lançou o álbum Ten e eu tenho pensado no Grunge. Nada tá isolado do fator tempo/espaço. As incertezas que renasceram fortes hoje já passearam no final dos anos 80 e começo de 90 e com certeza causaram essa mesma melancolia por lá. O Grunge é a materialização disso. Uma geração que sentiu tudo a flor da pele, tudo muito cru. Eles fizeram de letra de música grito de socorro. Eu poderia tá falando do Nirvana, do Soundgarden, mas só quero que o universo conserve o Eddie Vedder.

All five horizons
Revolved around her soul
As the earth to the sun
Now the air I tasted and breathed
Has taken a turn

Escutei Black diversas vezes nas férias. Poderia ter entrado naquela playlist que postei outro dia. Escrita por Stone Gossard, o que era para ser sobre um primeiro amor ganhou notas de fim amargo de relacionamento mal resolvido. Tem uma dor nessa letra, um desespero. É a tradução do ato de olhar para os lados e não encontrar. É aquele vazio enlouquecedor e uma dor que precisa de uma outra dor maior para ser capaz de ameniza-la. Dói muito.

Black foi uma das canções mais tocadas no ano em que eu nasci. Isso é tão sintomático. As crianças dos anos 90 foram embaladas a aura melancólica de um mundo enfrentando os paradigmas. Cada um tem o questionamento da própria existência. O ser ou não ser não foi invenção shakespeariana, mas já é sentimento crônico de cada vida que chora na boca de uma criança recém-nascida.

All the love gone bad
Turned my world to black
Tattooed all I see
All that I am
All that I'll be, yeah


Dia desses li algo que pra mim poderia ser musicada e cantada por Eddie e faria todo o sentido para tudo que o Grunge nos acostumou a ouvir. O texto dizia o seguinte:

  "Eu sinto frio
   Não sei porque sempre comento os mesmos erros.
   Estou tão assustado que irei arruinar tudo.
   Por que eu sou assim?
   Eu sempre fui assim.
   Eu nunca aprendo.
   
   Eu desejo me cortar (mas eu vou passar sem isso)
   Eu mereço.
   Mas quando o sangue corre por mim, sinto-me calmo.
   Eu esqueço quem eu realmente sou.
   Cheio de escuridão e vergonha.
   Nunca posso ser digno.
   ...
   Me sinto desesperado
   Por favor, faça essa dor desaparecer."

Não viemos programados para a dor, mas ela é realidade. A nossa insegurança dá as caras todos os dias e parece que mesmo não sabendo lidar com a dor terminamos por nos acostumar com esses percalços nossos de cada dia. Acostumar com a dor é algo deprimente.


Não há o que falar, tá tudo aí. No final de tudo, isso foi só um bloco de notas. Uma folha com registros soltos e desconexos de um dia que a melancolia se encontrou com a falta de humanidade. 


1 comentários:

Rayza. disse...

As crianças dos anos 90 ainda irão configurar grandes montantes nos gráficos de suicídio, pode apostar.
Talvez seu lattes não possa, diretamente, fazer nada por aquela criança violentada, ou por tantas outras, mas sabe, é dele que você precisa, dessa ferramenta, para ocupar os lugares onde os camisas vermelha por conveniencia estão (e também os camisa amarela e azul), e só quando pessoas como você estiverem nesse lugar, é que a vida dessa e de tantas outras crianças vai começar a mudar. Não pelo seu lattes - ele é só uma ferramenta do jogo dos Tronos, mas no qual você está jogando, e quando se joga, ou você ganha, ou você morre, e pessoas como Cercei continuam no trono - e sim por tudo o que você é.
Sabe, seu pai, assim como tantos outros professores e professoras, foram isso, e mudaram minha vida, me fizeram enxergar de outra forma, cruel, como você bem diz - afinal, as vezes me arrependo da "super visão" e queria ter tomado a pilula azul, a anestesia, e continuar na matrix - mas a visão necessária pra mudar as coisas. Eu mal te conheço, Alice, mas, pelo pouco que chega até mim, você é das pessoas que quebram a roda, então garota, bota esse grunge pra tocar, e vamo destruir esses forninho, ocupar esses espaços, fazer a nossa voz ser cada vez mais presente dentro dessa bolha universitária, e lutar pra ocupar os espaços.

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